
Angélica Vitali é daquelas pessoas que não têm medo de recomeçar. Publicitária por formação, encontrou na gastronomia um novo caminho - primeiro como hobby, depois como profissão e, hoje, como missão de vida. Referência nacional na gastronomia molecular, ela já passou pelo MasterChef como participante e como chef convidada, mas sua maior receita é a de superar desafios e se reinventar.
Entre sabores, ciência e superação, Angélica compartilha nesta entrevista sua trajetória, os aprendizados da vida e como a paixão pela cozinha se transformou em um projeto de vida - sem nunca perder a leveza e o entusiasmo por novos começos.
Angélica, qual momento exato em que a gastronomia se tornou seu novo caminho? E como foi essa transição de publicitária para chef?
Eu acho que não tem um momento que a cozinha virou meu novo caminho ou algo assim. Eu era muito feliz sendo publicitária, porém fui fazer gastronomia por hobby e desse hobby descobri uma nova paixão. Eu acho que nada é por acaso. A gente vai trilhando os passos e, aos poucos, eu, alguns anos, fui levando as duas coisas e chegou um momento que eu falei: "Quero ter razão ou quero ser feliz?". Era uma sociedade com família, então muitas vezes, às vezes, não é tão fácil. E aí migrei e continuei só com a gastronomia. Eu acho que a gente não tem que ter medo na vida de fazer nada. Hoje estou cozinheira, daqui a um ano, daqui a 10 anos, eu não sei o que pode ser. Já tem bastante tempo que eu estou na gastronomia, amo o que faço. Não pretendo mudar, tenho negócios voltados à gastronomia, mas também não tenho medo se um dia eu tiver que migrar de novo para outro lugar.
Você mencionou que a gastronomia molecular foi um grande incentivo. O que exatamente te atraiu nela, e como você a descreveria, já que muitas pessoas parecem ter uma ideia equivocada sobre o que ela é?
Na realidade, a gastronomia molecular foi o que me incentivou a me aproximar da cozinha de uma maneira geral, né? Eu fui fazer um curso de cozinha normal de formação de um ano. E aí eu sou muito curiosa, eu adoro coisas diferentes e eu vi na gastronomia molecular exatamente isso, coisas diferentes, né? A gente sai do cotidiano. Diferente do que as pessoas pensam que a gastronomia molecular é um tipo de cozinha, não é. É um conjunto de técnicas que cabem em qualquer área de alimentos e bebidas. Então, se faz desde um drink até uma sobremesa. E usando isso, não só da maneira lúdica como as pessoas estão acostumadas, mas os ingredientes que a gente usa, eles são usados nas indústrias de alimentos há muitos anos. Então, muita coisa é para dar maior rentabilidade, mais agilidade, melhoria de processos, enfim, e até na qualidade do produto. Então, isso tudo me encantou. Eu brinco que quanto mais eu aprendo, menos eu sei. Eu acho isso ótimo.
Você participou do MasterChef como competidora e depois retornou como chef convidada. Como foram essas experiências?
Quando eu fui para o MasterChef como participante em 2017, né? Eu já era uma chef consolidada, eu já era conhecida, já estava nas revistas, nos eventos de gastronomia, e para mim foi um desafio. Eu acho que a gente só está na vida para aprender e ali foi parte do meu aprendizado. É muito diferente, a pressão e tudo mais. Então, eu acho que eu não me soltei tanto quanto eu deveria, né? Eu não fui tão eu por conta dos momentos de pressão mesmo, mas foi incrível. Conheci pessoas maravilhosas, tenho amizade com eles, com os jurados até hoje. Em 2021, eu tive um convite, eu fui chef convidada, teve uma prova minha de gastronomia molecular que foi linda. Então, foi uma delícia voltar ao MasterChef, ao palco com aquela outra posição, estar ali naquele ambiente de novo. Muito especial.
Poderia compartilhar alguns dos desafios pessoais mais marcantes que enfrentou recentemente e como você consegue equilibrar uma vida profissional tão exigente?
Olha, eu já vinha em processo de mudança, mas 2022 foi muito marcante quando em setembro eu tive três AVCs, fiquei quase 30 dias internada e me trouxe algumas sequelas pouco visíveis, mas internas, né? Eu tive perda de memória, então eu tenho perda de memória do passado. As coisas ruins eu ainda continuo lembrando, elas podiam ter sumido, mas a memória presente eu tenho um pouco também, mas não é nada que me limita, né? Tinha na época perdido força do lado direito e é isso. Em 2023 eu enfrentei quase um câncer de mama. Em 2024 um tumor na cabeça, que por um milagre, no último exame para eu operar, porque ele estava bem grande, no último exame ele desapareceu. E esse ano, 2025, eu estou enfrentando um desafio muito grande na minha vida pessoal, mas como tudo na vida, passarei com glória.
Às vezes eu acho que eu vou ficar louca porque a demanda é muito grande. Eu dou consultoria, eu crio produtos novos para marcas, enfim. Mas eu acho que o grande lance é porque eu não trabalho, eu só me divirto, então eu estou o tempo inteiro em pura diversão. Então isso para mim não vira um fardo, né? E fazer viagens como estou aqui em Belém com amigos que eu amo tanto. Eu brinco que não dá vontade de ir embora, né? Já com data marcada para voltar. Então, é incrível. Essa relação, o trabalho me traz muita coisa boa.
Para finalizar, diante de tantas mudanças no mundo, como a pandemia e o avanço da internet, quais tendências ou transformações você prevê para a alimentação em geral e os hábitos de consumo?
Olha, a gente não tem como prever tantas coisas, né? Hoje a pandemia trouxe um boom de internet, né, onde as novidades estão muito mais rápidas do que seria normalmente. Mas eu acho que o cuidado com a saúde, o cuidado com o meio ambiente, a gente ter responsabilidade de onde vem o que a gente está comendo, né? Eu acho que tudo isso é o que vai fazer transformações muito grandes na alimentação de maneira geral. A gente tem que ter mais consciência, muita comida também sendo jogada fora e muita gente passando fome. Então, equilíbrio e consciência.