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Da história à inovação: o reencontro com o Mercado de São Brás

Olhares se encontram com o novo Mercado de São Brás, que um dia já foi símbolo de grandeza na Belle Époque durante o século XX, quando sua idealização e concepção foram realizadas. Desde lá o espaço, ao longo de 114 anos, já passou por três requalificações, a última concluída em 2024. Mas além de olhares, o mercado envolve histórias de sentimento afetivo e profissional que um dia iam se conectar. E essa conexão foi significativa para o engenheiro e arquiteto, Aurélio Meira, responsável pela requalificação magnífica que deu uma nova vida à edificação mais icônica de São Brás. 

“Sou belenense, tenho 73 anos e, portanto, 73 anos de contato visual com o Mercado de São Brás”, revela Aurélio Meira, ao traçar a ponte entre memória e projeto. Mais do que um espaço arquitetônico, o mercado é um território afetivo, histórico e cultural, agora requalificado para abrigar gastronomia, cultura e lazer. 


Patrimônio histórico e arquitetura metálica 

Inaugurado em 21 de maio de 1911, o Mercado de São Brás foi projetado pelo engenheiro italiano Filinto Santoro, também responsável por outras importantes construções em Belém. 

Sua construção foi impulsionada pela movimentação comercial gerada pela ferrovia Belém/Bragança, cujo ponto final era na estação de São Brás, tornando a área estratégica para o comércio de produtos. 


Aurélio destaca a concepção original do mercado, projetado por Santoro, que trouxe uma estrutura metálica importada da Europa e elementos arquitetônicos que mesclam o art nouveau e o neoclássico, tornando o mercado em um marco da Belle Époque paraense. Elementos como tijolos, cobertura, azulejos e treliças compõem uma arquitetura que sobreviveu ao tempo e às intervenções urbanas. 

O arquiteto enfatiza que preservar a memória histórica foi primordial, mantendo a estética e preservando elementos importantes, como as claraboias, ferro trabalhado, colunas e estruturas que compõem a parte externa do mercado.  

“Eu não mexi no portão de entrada. Há um painel de azulejo nouveau, que é a coisa mais linda do mundo. Na frente há duas cabeças de touro, nas intervenções anteriores cometeram um crime e pintaram, esses elementos eu mantive para preservar a identidade do Mercado”.  


Sustentabilidade e requalificação moderna

A restauração buscou aliar modernidade e sustentabilidade, sem comprometer a estética histórica. O telhado original, de fibrocimento importado da França, foi substituído por chapas de alumínio composto, material contemporâneo, durável e não corrosivo. 

“Foi o meu grande golaço. Sabe aquele gol que Pelé não conseguiu fazer? Foi assim, no último minuto, e ganhei a Copa do Mundo. Este material garante durabilidade e preserva a forma orgânica do telhado e destaca a beleza para quem passa pelo local”.  

  

Aurélio enfatiza que a escolha dos materiais e técnicas visou a funcionalidade contemporânea, garantindo que o mercado pudesse operar de forma eficiente, sem perder sua essência histórica. 

Além do telhado, ele conta que o piso foi desenhado pelo artista plástico, Geraldo Teixeira, que ressignificou sem deixar de destacar a elegância do espaço, mesclando o contemporâneo e o clássico. 


O olhar de Aurélio Meira: restauração e pertencimento urbano 


Aurélio Meira destaca a importância de preservar a história do Mercado de São Brás ao mesmo tempo em que se incorporam elementos contemporâneos. Em sua pesquisa, buscou referências nacionais e internacionais de requalificação bem-sucedida para transformar o espaço em um grande complexo dedicado à cultura, gastronomia e arte. 

Inspirado por visitas a mercados emblemáticos como o Mercado da Ribeira e o Campo de Ourique, em Lisboa; o Mercado de San Miguel, em Madri; e o Covent Garden, em Londres, Meira adaptou as ideias ao contexto amazônico e à cultura de Belém. 

“Estratifiquei o que se adaptava à cultura regional de Belém. Criei espaços para gastronomia, música, dança, teatro e literatura. Hoje, não chamo mais de Mercado São Brás, chamo Casa São Brás. É uma casa de cultura.” 


Um dos pilares do projeto é o fortalecimento do sentimento de pertencimento urbano e amazônida. Para isso, Aurélio incorporou sua identidade ao espaço de forma simbólica e funcional. Um exemplo dessa conexão são os vagões estilizados localizados na área externa do mercado. Modernos e contemporâneos, eles foram projetados como restaurantes e têm sua estrutura composta por placas que remetem à textura do couro do pirarucu, um dos peixes mais emblemáticos da Amazônia. 

“O mais importante foi identificar formas orgânicas no projeto que remetessem a elementos regionais. São detalhes que muitas vezes passam despercebidos, mas que conectam a memória afetiva da cidade ao espaço”. 

Além desses elementos sutis, Aurélio propôs a criação de quatro painéis artísticos que estabelecem um elo entre a história do Mercado de São Brás e o sentimento de pertencimento à chamada cidade morena. A iniciativa reuniu artistas locais que deixaram sua marca através de expressões únicas. 

“Convidei quatro artistas plásticos para criarem painéis que homenageassem a história do mercado e de Belém”.  O primeiro, de autoria de And Santos, artista popular de rua, retrata a Gale de São Brás durante o período da Belle Époque. 



O segundo, criado por Jorge Eiró, arquiteto e morador do bairro de São Brás, representa a malha viária da cidade, destacando os pontos de importância após a construção do mercado. O terceiro, idealizado por Bob Menezes, traz uma perspectiva fotográfica da pedra do peixe, voltada para o Mercado de Ferro do Ver-o-Peso. O quarto e último painel, assinado por Paulo André, é uma pintura que redesenha de forma memorável as barcas da Doca do Ver-o-Peso. 


Com esse projeto, Aurélio Meira transforma o Mercado de São Brás em um espaço vivo, onde tradição e modernidade convivem em harmonia, resgatando memórias e projetando novos significados para a cidade e seus habitantes. 

 

Antes e depois do Mercado 

Aurélio observa que a maior transformação do Mercado de São Brás não foi apenas estética, mas também social e funcional, ressignificando o local sem perder sua essência. 

“Eu quero criar espaços onde seja possível implementar tudo aquilo que acredito que vai acrescentar ao Mercado de São Brás. Antes, era um espaço subutilizado; agora, é vibrante, com palcos internos e externos, restaurantes e áreas de convivência. É o coração cultural do bairro. A ideia principal foi transformar o mercado num grande centro de gastronomia, recreação e lazer”.  

Detalhes como os ferros trabalhados, claraboias, portais e frisos foram cuidadosamente restaurados, preservando a identidade original do mercado desde sua idealização e construção. 

“As grades, os arcos, as portas externas são originais. Protegi cada detalhe para que a memória visual do mercado permanecesse intacta.” 

Hoje, o Mercado de São Brás é um centro cultural e gastronômico que abriga lojas de comidas, livrarias, exposições e galerias de arte. Com 3.300 m² e 348 feiras e lojas distribuídas, o espaço também preserva setores tradicionais, como a feira, o mercado de peixe e carne, o artesanato, a mercearia e a praça de alimentação. 


A restauração minuciosa dos elementos arquitetônicos permite que o mercado continue sendo um elo entre o passado e o presente de Belém. Como resume Aurélio Meira: “Hoje não chamo mais de Mercado São Brás. Chamo de Casa São Brás. É uma casa de cultura”.